Não te esqueças de que a tua frase é um acto. Se desejas levar-me a
agir, não pegues em argumentos. Julgas que me deixarei determinar por
argumentos? Não me seria difícil opor, aos teus, melhores argumentos. Já
viste a mulher repudiada reconquistar-te através de um processo em que
ela prova que tem razão? O processo irrita. Ela nem sequer será capaz de
te recuperar mostrando-te tal como tu a amavas, porque essa já tu a não
amas. Olha aquela infeliz que, nas vésperas do divórcio, teve a ideia
de cantar a mesma canção triste que cantava quando noiva. Essa canção
triste ainda tornou o homem mais furioso.
Talvez ela o recuperasse
se o conseguisse despertar tal como ele era quando a amava. Mas para
isso precisaria de um génio criador, porque teria de carregar o homem de
qualquer coisa, da mesma maneira que eu o carrego de uma inclinação
para o mar que fará dele construtor de navios. Só assim cresceria essa
árvore que depois se iria diversificando. E ele havia de pedir de novo a
canção triste.
Para fundar o amor por mim, faço nascer em ti alguém
que é para mim. Não te confessarei o meu sofrimento, porque ele te
faria desgostar de mim. Não te farei censuras: elas irritar-te-iam
justamente. Não te direi as razões que tu tens para amar-me, porque...
não as tens. A razão de amar é o amor. Também não me mostrarei mais, tal
como tu me desejavas. Porque tu já não desejas essa. Se não,
amar-me-ias ainda. Mas educar-te-ei para mim. E, se sou forte,
mostrar-te-ei uma paisagem que fará de ti meu amigo.
Antoine
de Saint-Exupéry, in "Cidadela"
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